sexta-feira, 11 de abril de 2014

# reino da república


Assim que conheci a Escandinávia particularmente os reinos da Dinamarca, Suécia e Noruega , disse ter encontrado o maior e melhor Estado de Bem-Estar Social do planeta.

E mais: disse que, se é possível existir a Utopia, essa terra seria aquele conjunto ali, com mais uma ou outra praça mundo afora.

E não falo à toa, pela imaginação fértil da viagem, pelo deslumbramento do que se vê nas ruas, parques, praças, casas e pessoas escandinavas ou, ainda, pelas explicações e revelações da gente nativa.

Falo também por isso tudo, é claro, mas é possível falar principalmente pelos números, pelas pesquisas e pelos estudos que desnudam a vida, a sociedade e o Estado nas terras vikings.

"Índice de Desenvolvimento Humano", "Taxa de Sonegação Fiscal", "Número de Homicídios", "Dados de Saúde Pública", "Pesquisas de Satisfação de Vida", "Estatística de Crimes contra a  Ordem Financeira", "Índice de Felicidade", "Estudos de Eficiência e Eficácia Educacional", "Ecologia e Sustentabilidade", "Modo de Relacionar Capital e Trabalho", "Coeficiente de Gini" e "Mulheres Lindas e Simpáticas".

Em tudo e em todos os levantamentos, a Escandinávia é praticamente imbatível.

E por aqui alguém fala nela? A grande mídia se debruça sobre isso? E a nossa política? E os donos do poder? E a turma da grana? E a classe média?

Não. Para quase toda esta gente, o modelo, o paradigma e o fim é os Estados Unidos da América. Por quê?  

Ora, porque lá como aqui, o vale-tudo é permitido, a falácia da "meritocracia" hipnotiza todos e o ter supera tudo, diz tudo e vale por tudo. 

Porque lá como aqui a desigualdade é aceita como lógica do sistema, o Estado é proibido como um mal patológico e o mercado é louvado como um ser mitológico; o consumo é supra-humano, políticas sociais são desumanas e o umbigo é o ser humano.

Porque lá como aqui, educação, saúde, segurança, transporte, energia, a água... a vida deve ser privatizada, vendida, comprada, mercantilizada, se quiser alçar voo. 

Porque lá como aqui, impera a sociedade de vencedores e vencidos, de bem-nascidos e mal-nascidos, de encastelados e periféricos, e cada qual deve se suportar e se convencer desta efeméride. 

Ora, não agrada aos nossos "donos do poder" que um Estado seja a cabeça pensante e organizadora da realidade nacional, que uma sociedade se reveja, se refaça e se reconstrua para socializar o bem-estar.

E como na Escandinávia a educação é exclusivamente pública, a saúde é eminentemente pública, o mercado participa no que deve participar, a desigualdade alcança níveis monásticos, todos pagam tributos e os ricos pagam mais tributos que todos e todos vêm (quase) tudo funcionar, todos defendem e compartilham da res publica e, fundamentalmente, todos se veem como cidadãos.

E já aqui este grande segredo: mesmo sob monarquias, estes países conseguem estabelecer que a virtù está também nos seus cidadãos, e assim adorar um dos máximos princípios – ou "molas", como ilustra Bobbio – que movem as repúblicas.

Por fim, e por tudo, todos acreditam no Estado.

Estado que aqui é motivo de chacota, asco e ódio – e por culpa dele próprio, mas que infelizmente apenas reflete o jeito da maioria da nossa gente.